SOPHIA E ALICE CONTORNAM O ABISMO
"(...) O problema de Alice, como atrás se disse, é a descoberta de si própria. A descoberta da “pequena chave dourada” (Carroll 2000: 13) que lhe dá acesso ao jardim configura o contacto com um mundo mágico for- matado à medida dos seus desejos. O jardim torna-se na concretizção dos seus desejos, do prazer da vida, pois viver aí é uma aventura, de descoberta do mundo e de si mesma. Para se manter nesse jardim, Alice tinha que constantemente aumentar e diminuir de tamanho, vivenciando os mesmos conflitos que a levaram para este mundo. Assim este espaço se torna tumultuoso porque as dúvidas de Alice são as mesmas do mundo real. Com isto se vê que o jardim representa um reflexo claro da realidade. A viagem mágica é uma viagem para o eu oculto, um outro projectado e alienado de nós. O jardim é aqui sinónimo de secretismo, sendo este, para Alice, a descoberta infantil do mundo, da beleza e da vida que ela mesma idealizara. Ele é, de facto, a contestação da identidade pessoal, do jogo dinâmico de redescoberta de si e do mundo. Por outro lado, carreia a dúvida mortificante: o que fazer com o eu descoberto? Como mostrar a um mundo velho esta nova imagem conseguida no jardim, através da transfiguração dos símbolos mais profundos do amor. (...)"
Isabel Ponce de Leão
"(...) Falei, no início em abismo, como termo referencial dos dois textos; de facto, o abismo evoca o imenso e profundo inconsciente e convida à exploração das profundidades da alma; conhecer essas profundidades parece-me ser o grande objectivo dos dois contos: Alice cai por um abismo para um mundo maravilhoso; a mulher do conto de Sophia vê para lá desse abismo a sua eventual salvação. Esta queda para as profundidades tem, na sua génese, a viagem, metáfora conceptual de que Lakon se ocupou, e que aqui aparece sob a forma de uma aventura e de uma procura demandando o mero conhecimento espiritual, de quem a protagoniza; verdadeira e única viagem do homem ao interior de si próprio."
Isabel Ponce de Leão
LEWIS CARROLL E SOPHIA DE MELLO
BREYNER:
A IMPORTÂNCIA DOS ESPAÇOS SIMBÓLICOS NA METAMORFOSE DO SUJEITO
A IMPORTÂNCIA DOS ESPAÇOS SIMBÓLICOS NA METAMORFOSE DO SUJEITO
"A Floresta é um conto de Sophia em que a autora vai privilegiar espaços simbólicos como o jardim e a floresta. Também Carrol com a sua pequena Alice, a faz entrar no “ lindo jardim” e ambos utilizam uma linguagem carregada de memória visual que permite ao sujeito / herói tornar-se objecto e experiência de linguagem num mundo que, apresentando-se interior, sustenta já uma dimensão de eternidade. É o caso quando os respectivos autores se detêm em certas palavras com o é o caso de “jardim” ou em certos espaços cercados ( lago, bosque, toca, túnel), simbólicos dos percursos circulares de auto-conhecimento dos seus heróis."
Maria Antónia Jardim
by Love1008
"(...) Gera-se então um ciclo infinito de invenção: o espaço da árvore
transfigura-se num espaço maravilhoso, fazendo com que o esquema imaginário da guliverização se evidencie: “ Parecia-lhe que
viver entre anões devia ser uma coisa maravilhosa. Imaginava as
casas dos anões...”(p.14). Também Alice entra numa caverna: a toca
do coelho, espaço túnel, espaço queda, espaço viagem interna,
encontro com o coelho vestido de colete e com um relógio de bolso e o interessante é que Alice, graças a uma bebida mágica, minga de tamanho: “ Que sensação estranha!, disse Alice, “Devo estar a
fechar-me como um telescópio!” ( p.11). Trata-se da atracção lúdica
e imaginária pelos espaços interiores, o fascínio pelo avesso das coisas e pelos locais inacessíveis."
Maria Antónia Jardim
"Ambas as heroínas viajam em círculo. Para além das características
do espaço remeterem para uma circularidade, também os percursos que os heróis iniciam são circulares, na medida em que partem
de um espaço e a ele regressam. A viagem é, assim, um símbolo
iniciático através do qual se tem acesso a um maior conhecimento que permitirá iluminar a consciência que o regresso pressupõe.
Desta experiência emerge o Ver, o Pensar, a Memória e a Viagem
como propulsores de conhecimento. Não nos esqueçamos de que as Maravilhas estão dentro de nós, o jardim e a floresta crescem conosco."
Maria Antónia Jardim
SINOPSE
"Este encontro sobre uma das mais extraordinárias escritoras do século XX, procurou ser um espaço simbólico de intercultutra académica, através da convergência de olhares plurais e cientificamente diferenciados sobre o mesmo objecto, no sentido, não de buscar a leitura, mas de promover leituras e, sob elas fixar e recordar o texto original. Assim encontramos os contos de Sophia a serem olhados pela hipermédia, em hipertexto com Alice de Carroll, pela ética, com uma nova gramática imaginativa, pela psicologia e pela antropologia num dinâmico diálogo em que o espanto e o sonho são convidados de honra. Ambas, Sophia e Alice, gostam do Outro lado do espelho, do outro lado das maravilhas, permitindo assim que a imaginação enquanto pedagogia da alteridade se revele fantasticamente! Mais ainda, este encontro promoveu um desafio às artes plásticas que também estiveram presentes sob a forma de pintura e escultura. Foi uma homenagem das Belas Letras a Sophia de Mello Breyner Andresen. As organizadoras do encontro, Maria Antónia Jardim, Maria do Carmo Castelo Branco e Maria Isabel Vaz , agradecem aos Centros que apoiaram este evento assim como o apoio das Edições Fernando Pessoa para a publicação das Actas do mesmo."
Sophia no País das Maravilhas - CD de Isabel Vaz Ponce de Leão.
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